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domingo, 21 de julho de 2013

Hoje

Ontem eu perdi a maior parte do meu cérebro. Nada podia respirar dentro da roupa, nada podia respirar dentro dela, nada nada nada nada achava ar buf, acorda marinheiro, nada marinheiro, voa marinheiro – era isso que eu pensava quando a britadeira destruiu o meu hipotálamo, abriu as minhas sinapses com a força do ferro encardido de um ferro velho, velho, velho estilo, velho hábito de me sentir velho de me sentir grande demais, magro demais, ian demais, muito demais demais, demasiadamente nada: a ilha perdida, onde todas as coisas vão parar era a minha coleção indiscutivelmente grande (demasiada) de minúcias gestos tudos que não cabiam, nada cabia, nada podia respirar: explodia com o choque tremendo do ferro velho nos miolos, fundia a cabeça, fudia com tudo...

Quando os miolos e todo o sangue foram vistos pelo mesmo aparelho destruído, o mesmo destruído náufrago das ondas cerebrais das correntes de estilo de maneirismos surrealistas (aquelas mesmas naves, aquelas mesmas vezes que tentamos juntos navegar, trocar, se olhar nos olhos antes do brinde, tudo isso que preenche o estômago e os pulmões e que sufocam e acabam vomitados pra fora com nervos e sangue quando a gente explode a testa com uma britadeira ou com uma arma); quando eles foram vistos sentou-se de pernas retas longilíneas pernas retas, as mesmas que vejo todos os dias, e todo o corpo ardia como um impulso, como uma agulha na ponta do pênis. Não, não como uma agulha, como uma mordida na ponta do pênis depois de uma chupada sua sua sua sua sua sua sua sua sua sua sua sua: você é um monstro, você eu é um monstro horrível e sem miolos, sem sinapses sensível: se.

Não se pode acordar porque não se pode dormir; não se pode dormir porque não se pode acordar também seria correto, também. Amei as suas juntas juntas com as minhas, com a respiração conjunta de um bicho morto agonizante agonia demais demais. Só via você, só te ouvia, só só só só só só só... Aceita? Não. Não não é isso que você está pensando, eu não estou pensando, é isso sim, mas se você souber que é, deixa de sê-lo no mesmo instante, deixa pra lá não é mesmo não. Não sei, na verdade, talvez seja.


Se um dia você fizer como eu ontem e explodir como um zepelin a hélio, como um gás inflamável de um desodorante, lembre de não queimar os cabelos, eles você preserva, eles cuidam de você, da sua cabeça, pra no dia seguinte você não aparecer desfigurado sem um pedaço imenso do crânio faltando com nada dentro nada dentro da cachola e dos pulmões. Nada.


segunda-feira, 3 de junho de 2013

You feel like a bug

"E o corpo não agia,
Como se o coração
tivesse antes que optar
entre o inseto e o inseticida."
Tentando começar esse texto uma segunda vez. A primeira não ficou boa. Temos falado muito sobre drogas pesadas, ácido, cocaína, heroína. E a cada vez que alguém sugere um ensaio na companhia delas eu estremeço. Ontem eu caí no choro no meio do exercício. O mais difícil é não fazer desse relato, para mim tão importante, uma coisa meio comédia romântica, meio campanha da Globo contra as drogas. Porque não se trata disso. Eu sei que a minha experiência não pode ser tomada como padrão, até porque, e isso talvez fique claro ao longo do texto, a minha visão é bastante parcial. E passional.

Quando eu tinha 16/17 anos, eu estava apaixonada pela menina com quem eu estava ficando. Acho que não a amava, mas tinha alguma coisa muito boa entre a gente, e eu estava curtindo ficar com ela. Filme dos anos 90 retratando a década de 70: a gente bebia, fumava maconha, escrevia em máquina, ouvia música em vitrola (“ela é minha menina... e eu sou o menino dela”), cinema, poesia, filosofia, teatro, política, nada para fazer o dia inteiro.

Eu não sei bem com certeza quando foi que um belo dia as coisas começaram a desandar. Tenho lembranças muito borradas dessa época, como se tudo estivesse envolto numa grande nuvem da fumaça dos cigarros que a gente fumava sem parar. Nós no apartamento vazio dela, vazio vírgula, ela tinha sempre um bando de fiéis escudeiras que varavam a noite com a gente. Quando eu me dei conta, tudo já era demais: álcool demais, maconha demais, eu não conseguia acompanhar. Por isso foi mais difícil pra mim, acho, eu não conseguia acompanhar o ritmo delas. Ou não queria.

Tem uma coisa importante nessa história: inteligência pra mim é afrodisíaco. Eu gosto de pessoas inteligentes, gosto de achar que eu sou inteligente, e eu gosto de ficar com pessoas que eu considero inteligentes (mesmo que depois eu termine por perceber que ela só parecia inteligente). Eu tenho um medo do caralho de fuder com o meu cérebro.

M. era inteligente. Mas como eu disse, drogado só tem graça para outro drogado, e drogado só é inteligente para outro drogado. Drogados na verdade são chatos. São como os bêbados, mas em escala maior. De tudo ficar demais e elas partirem para o ácido foi um pulo. Até hoje eu não sei bem o que elas tomavam, mas tudo mudou, a começar pelo vocabulário: doce, bala, pó, loló, acho que ela foram na lista toda. Eu não fui junto, mas fiquei junto. Telefonema às três da manhã: eu to morrendo, vem pra cá. Eu ia. Quarenta minutos pra completar uma frase e eu ouvindo, uma hora e meia dela vomitando pela casa e eu limpando, ela se acabando e eu não fazendo nada. "Eu morrendo e você pintando as unhas de vermelho." E mesmo quando estava limpa, começou a ficar chato. Muito chato. Ela era bonita e tinha vigor, uma força que vinha de um outro lugar, e foi se atrofiando, foi perdendo.

Não foi rápido, foi lento. E não foi até o fim. Isso quer dizer, ela não se acabou na beira da estrada drogada e prostituída, não que eu saiba. Sei lá. Eu saí antes, para mim estava de bom tamanho. Mas acho que ela vive uma vida bem parecida com a minha, faculdade, trabalhos, barzinho, festa. Nem sei se ela ainda toma essas coisas. Mas perdeu, percebem? Perdeu o encanto, a graça, a força, ficou feia, empobreceu.

Eu parei de fumar maconha, não tenho coragem para nenhuma outra droga além do álcool, e mesmo assim, só de vez em quando. Não gosto nem de beber todo final de semana, embora tenha feito isso com frequência ultimamente. Gosto de alternar cerveja com cinema e teatro, numa tentativa idiota de manter o meu cérebro do mesmo tamanho.

Sinto que não consegui colocar no papel a angústia que eu sinto toda vez que me lembro do que M. foi e do que ela ficou. O que me assusta é isso, é que ela não virou doidona drogada, ela usa de vez em quando, o que muitos diriam ‘numa boa’. É muito fácil e covarde eu esperar chegar em casa, atrás do computador, pra contar isso para vocês, sem ter que olhar no rosto, sem ter que segurar as lágrimas, essas coisas todas. É muito mais fácil esse texto sair clichê e meio brega do jeito que saiu e eu não querer publicá-lo, como se isso servisse de desculpa.