03 de fevereiro (Abraçaço Caetano, The Hips of Tradition Tom Zé)
Ok. Tenho que passar a limpo o que escrevi a respeito do ensaio que rendeu a primeira cena. Enfim o primeiro ensaio, houve dois outros encontros que precederam mas não foram ensaios. Talvez ainda um terceiro. Um, o primeiro, ainda na pilha que deu o primeiro pontapé, antes da oficina do Amok, éramos eu, Lo e Ian. Ainda estávamos totalmente na dimensão da incompreensão quase total. Eu havia entendido uma coisa de minha proposta, Lorrana outra, e não sei o que Ian esperava, mas creio que algo mais próximo do que eu esperava. Utilizamos um horário que a Lorrana usava pros seus treinamentos. Então ela entendeu que queríamos treinar com ela. Naturalmente. Mas ficou de fora da sua expectativa a ideia que eu havia dito em poucas palavras, mas dito de todo modo. Que era o desejo de trabalhar o conto do Graciliano Ramos, e tentar ligar isso com a pesquisa dela sobre velhice, ou fosse o que fosse, pelo Dias Felizes, que ainda que não se aproxime de uma abordagem realista da velhice, num sentido estrito, é talvez uma maneira riquíssima de abordar o tema. E o treinamento. Tudo isso junto. Acho que ficou confusa a ideia. Ou melhor, tenho certeza que ficou confusa. Treinamos durante quase todo o tempo, quase ao fim, me sobrou capaz cerca de meia hora pra falar um pouco a respeito do que achava sobre o que queria falar do projeto que mal se delineava ali. Falei uma porção de coisas. Muitas delas eram bobagens, derivações talvez muito pobres do que havia muito recentemente lido no livro do Boal, o teatro do oprimido, levei pro encontro também o Grotowski, também dele derivei bobagens, mas em menor quantidade. Depois fui reparar na insuficiência do gesto de trazer materialmente (pessoalmente? Espiritualmente?) a bibliografia sem o gesto (não complementar, mas fundamental) de ser capaz de embasar seu discurso naqueles caras, ou coloca-los em questão, mais do que meramente ler até o fim, e pensar “parece inteligente, concordável”, e concordar e não acrescentar nada, aí é só fazer quem quer seja também ler o texto e apreciar como o escritor fulano de tal é virtuoso e inteligente.
Lembro-me de um segundo encontro. Estávamos todos, mas não sei por que não fizemos nada. Não consigo me lembrar. Nesse dia levei também o livro do Guattari. Vale o que eu disse a respeito dos outros dois, um pouco. Porque dessa vez estava falando mais especificamente do conto do Graciliano. Malhando uma cena que vimos, falando de como era contra-referência. Talvez aí, acho que já tinha assistido Morangos Silvestres, citei como referência no tocante a abordagem da velhice, e, não sei se citei, imagino que não, acho que porque inclusive vi nesse dia (ou foi no outro ensaio? No encontro anterior?), enfim, o caso é que tenho pra mim aquele serestando da moça lá do lume como espécie de contrarreferência por mais que lembrando agora, é possível que a dança dela, quando fazia a garotinha tenha se insinuado no meu aquecimento, quando agora entro em cena ou antes de ensaios, fico de certa maneira eufórico, corpo irrequieto, também me lembra o Stephane quando estávamos todos aquecendo, bem possível que eu procure copiar esses caras, mas no caso dele era algo mais ritmado, o dela tinha a impressão que tinha uma espécie de forma tal, mas não exatamente ritmado, ou melhor, ritmado, sim, mas não um ritmo regular, ah sei lá. Por que contra? Porque a descrição pretensamente mimética de certo modo asséptica me incomoda. De que vale o ator copiar uma imagem real, se dela não faz nenhum uso interessante senão mostrar sua própria capacidade virtuosa de ser capaz de imitar? Ouço represália pesada baixinho. Nada contra virtuoses, mas. Dou o desconto de ter se tratado de uma demonstração de trabalho, mas o incômodo não se extingue feita esta concessão. O velho por ser velho é já interessante? Como assim velho? Parece-me que assim se desconsidera toda sua história de vida, suas ideias, seus preconceitos, tudo, enfim, em prol de sua circunstância, ninguém é velho senão num devir. Ela não falava somente de velhos, ok. Refiro-me a esta parcela do trabalho. Bergman é bem mais inteligente. “Fumar não é um vício para mulheres” “Quantos anos o senhor tem?”. Sacou? É uma pessoa, não um velho. Às vezes parece que estamos sempre escapando ao momento de nos posicionar a respeito de qualquer coisa que seja.
Agora me dei conta: pensava que era serestar ser+estar, mas pensei em seresta. Serestar. Eita. Ainda que ache que seja a primeira ideia.
Acho que o segundo encontro foi um pouco esse papo. No terceiro, Lorrana não estava. Não tínhamos sala. Sentamos ali no Tolezano, falei um pouco sobre ideias que tive pro processo. Falei de que queria tentar proximidade com algumas ideias do Faustini. Maneiras de pensar nesse processo como algo a ser mostrado por aí. É certamente ilusão julgar que já iniciamos essa proximidade com postar os vídeos das cenas feitas no grupo do facebook. Acho que isso simplesmente facilita uma espécie de conhecimento comum a respeito do projeto pelo grupo inteiro, não apenas os que estão fazendo. Haveria mostra de processo no castelinho. Não sei . Expliquei o que gostaria de fazer no encontro seguinte. Que foi já em 2013. Sobre ele passo a limpo o que escrevi mais tarde.
[segue ainda]
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