segunda-feira, 14 de outubro de 2013

pensando alto (1)


O que já usei de Dias Felizes na peça:
 

Primeira fala, página 42: Não parece que se está pedindo muito, na verdade às vezes tem-se a impressão de que seria quase impossível – (voz entrecortada) – de se pedir menos... de um semelhante... para dizê-lo com comedimento... mas quando realmente... quando se para pra pensar no caso... considerá-lo com carinho... perceber o outro... suas necessidades... paz... ser deixado em paz... então talvez a lua... o tempo todo... a implorar pela lua.

Vem de um pedido da Winnie ao Willie, que ele tente vê-la. “eu sei o que você está pensando, não basta eu ter que escutar essa mulher, agora vou ter que vê-la também”. Ela considera estar pedindo muito do Willie, ainda que peça pouco, e reconhece que pedir pouco já é pedir muito. Ou melhor, para focar-me nas palavras do Beckett, a ideia de que às vezes nem parece que seria possível pedir menos (de um semelhante, para dizê-lo com comedimento [meu grifo: dizer com comedimento!? Haha, como assim. O que ela deixou de dizer? De fato, semelhante é muito comedimento, é limitar por baixo: não sei o que dizer deste aí, senão que ok, se parece o suficiente comigo fisicamente para eu dizer semelhante. E isso: trata-se de características físicas. Dizer "alguém" seria demais. Tem possivelmente demasiada abstração na ideia de "alguém".]).

Ou seja, Ba começaria a peça a partir de uma demanda feita por ela, uma demanda que não é (não teria sido) satisfeita. Seria isto, então. Seria isto, isto é. Seria porque não é. E não é porque suprimi a parte da fala que indica isso. A parte da fala que envolve o pedido da Winnie a Willie.

De modo que ficamos apenas com a parte em que Winnie faz uma generalização a respeito de se pedir pouco. Não creio ser possível aproveitarmos ao máximo a ideia de Beckett aqui, a saber, testemunharmos o pedido de Winnie, sabermos que não se trata de algo infactível, que, porém, não levado a cabo por Willie: olhar para ela. Diante disso, ela conclui que, de fato, está pedindo muito de Willie.

O problema de começarmos com Ba falando isso é que distorcemos a ideia de Beckett consideravelmente. Porque ele parte de um caso específico. Winnie pede que Willie olhe na sua direção. Diante da falta de resposta, ela conclui que está pedindo muito, apesar de: que pensa pedir pouco; que às vezes, pensa-se, não é possível que se peça menos.

Quando suprimimos a situação que gera a sentença, ficamos apenas com um axioma. Que é bonito, vá, mas perde bastante força. E fica com ares de verdade. Se liga no que eu vou te falar agora. Porém pensemos com o contexto do que até agora se desenhou: No ouve o despertador, vai até o outro cômodo e liga o abajur sobre a cabeça de Ba. Ela fala.

O que pode haver é alguma espécie de ideia de agressão por parte de No. 

Enfim, não pode começar daí.

Talvez:

[p.56] vejo olhos que parecem se fechar em paz... para ver... em paz (Pausa.) Não os meus. (Sorri.) Não agora (Sorriso mais largo.) Não não. (Desfaz o sorriso. Pausa longa)

Acho muito bonito começar assim. Muito mesmo. Talvez alguma coisa que se aproxime de uma demanda feita por ela.

Conclusão: Ainda gosto da ideia de permanecermos com a primeira parte, p.42. Porém não precisa ser imediatamente após esse primeiro momento. Nem muito menos será o primeiro momento. Próximo.

Primeira fala: Vejo olhos. P.56

Sim, estamos de acordo. Claro, até nos convencermos do contrário.

[...]

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